sábado, 2 de abril de 2011

O que não se fala

Ela olhava pela janela, ela olhava o mundo tentando entender, tentando achar respostas, tentando procurar o que precisava, o que aliviaria tudo aquilo, o que finalmente lhe traria a paz de volta, ou pelo menos tiraria aquele amargo gosto de sua boca. Ela procurava, mesmo sabendo que não acharia, porque o que ela precisava estava muito longe dali.

Os olhos denunciavam o que havia acontecido na noite anterior. Olhos de dor, de quem chorou muito por sentir o coração arrebentar em milhares de pedaços, de quem sente uma tristeza tão forte que fica difícil respirar, de quem precisa de alguém e sabe que não vai ter. Era incontrolável, as lágrimas insistiam em não parar. Agora encarando o mundo ela ficava na ressaca da dor, lembrando de uma noite terrível.

E, sem notar, estava de novo ali. O olhar curioso de quem entra pela primeira vez em algum lugar. Caminhava a passos lentos, observando os mínimos detalhes, queria guardar toda lembrança que pudesse pra quando não estivesse mais lá. Haviam detalhes no teto, paredes brancas e muitas histórias que ainda aconteceriam. E então olhava para ele e sentia aquela angústia de quem sofre com os segundos que insistem em passar fazendo o fim chegar logo. Desejava que o tempo parasse para poder ficar ali, para o momento não acabar.

Ficaram sozinhos. Não havia mais as vozes das outras pessoas ou a presença delas, agora podiam voltar a ser quem eram quando estavam só um com o outro. Ela tinha vontade de abraçá-lo, porque ele fazia seu coração pular mais forte, mas, ao mesmo tempo, ficar em paz. Ela tinha vontade de beijá-lo, porque eles tinham algum tipo de atração inexplicável. Ela tinha vontade de dizer o quanto estava tão apaixonada por ele e tudo o que ele tinha feito com ela, toda a ansiedade que ela sentia quando ele estava longe e como o dia dela ficava feliz só por ele aparecer. E ela reviveu o abraço acolhedor e os beijos fervorosos, sentiu mais uma vez seus cabelos passando pelos seus dedos. Ouviu de novo sua voz calma e doce, e sua risada fácil quando ela falava alguma bobagem. E os olhos, ele sorria com os olhos e não com os lábios e ela adorava isso. Ouviu, por último, a voz grave da música ao fundo que falava sobre uma mulher que havia partido.

Voltou para o presente como se tivesse deixado mais um pedaço dela para trás. Um pedaço que faria falta mais tarde. Ela sabia que depois daquele dia tudo poderia mudar, por isso tinha aproveitado cada instante. Ele foi embora. Ele se foi, mas todo o resto ficou. Ele foi embora, mas não levou o sentimento dela com ele, não, ele foi embora e ainda deixou o sentimento dele junto com ela.

E como ter raiva dele? Culpando-o? Como culpar quem fez exatamente o planejado? A culpada era ela, somente ela, sabia disso. Ela quebrou a regra e quis mudar os planos. Mas, ora, os homens não sabem então que as mulheres nunca cumprem o que planejam?



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